Por Paloma Sama
Atualmente os jogos eletrônicos têm uma força absurda.
A indústria cresceu infinitamente mais desde que começaram a ser consumidos com mais frequência a partir dos anos 1970 por diversas plataformas como fliperamas, consoles, jogos de computador e até de celular.
Faturando bilhões por ano, não parece ter qualquer previsão de freio, muito pelo contrário.
Apesar de as prioridades serem a experiência, fluidez, mecânica de jogo, etc. Os desenvolvedores vêm trabalhando e priorizando jogos com enredos excelentes (coisa que não necessariamente era importante para se ter um bom jogo), dignos de livros, dignos de filme. Temos muitos exemplos disso e esse quadro está surgindo justamente para falarmos sobre isso. Conhecermos jogos, novos e antigos, com potencial de ótimas narrativas para serem consumidos lentamente, enquanto apreciamos a beleza de toda essa arte. E que, obviamente, nos traria uma experiência dupla de poder ler e imaginar e depois vivenciar na tela, cada evento lido anteriormente.
Então, sem mais delongas, vamos para o primeiro dessa lista, um dos meus enredos preferidos:
Watch Dogs
(Lançado em 2014 pela Ubisoft – Jogo de ação e aventura)
Após o apagão que ocorreu nos Estados Unidos e no Canadá em 2003 (informação verídica), a qual descobriram ser ação de um hacker (ficção do game), Chicago e tantas outras cidades tornaram-se adeptas ao ctOS (Sistema Operacional Central). Um supercomputador que possui um sistema que controla basicamente quase todas as tecnologias da cidade e anexa informação sobre todos os residentes e suas ações do dia a dia.
Sua vida é totalmente exposta a ele, seu nome, idade, seus gostos, quanto ganha, o que compra… Nem mesmo seus desejos mais sórdidos ficam escondidos. Assustador, não? Essa é a primeira camada do jogo. A ideia gira em torno do conceito de crime de informação, interligação de dados e o aumento do uso de tecnologia em todo o mundo, o que não se difere muito do que vivemos atualmente. O aumento da tecnologia deveria vir para o bem, para nos auxiliar (o que de fato acontece, às vezes), mas tanto no game quanto na nossa realidade, também vem sendo usado para destruir vidas.
Tendo isso em mãos, vamos para o prato principal que é a história de Aiden Pearce, o protagonista. Ele é um irlandês que se mudou ainda jovem para os EUA com sua mãe e irmã para terem uma vida melhor, longe do pai abusivo. Vivendo em um bairro pobre, Aiden envolveu-se com gangues locais e aprendeu coisas com eles, como atirar, bater pra valer e cometer pequenos crimes, além de ter crescido aprendendo sobre computadores, adquirindo habilidades importantes.
Quando conhece Damien Brenks, um hacker que lhe oferece uma oportunidade de faturar muito mais dinheiro — Aiden deveria ir a lugares luxuosos, invadir contas bancárias e dar a Damien a chance de roubar o dinheiro dos outros —, ele aceita. Exercem essa atividade por um tempo até que numa nova tentativa, dessa vez no luxuoso hotel Merlaut, são descobertos por outro hacker, o que coloca tudo a perder e eles fogem com o rabinho entre as pernas.
Como vingança pela invasão e achando que a dupla tinha visto o que não devia durante o hackeamento, Dermot "Lucky" Quinn, o dono do hotel Merlaut, contrata alguém para ir atrás dos dois. Damien foi encontrado, atacado e aleijado dentro de sua própria casa, enquanto Aiden, que estava com os dois sobrinhos em seu carro em uma viagem, teve o veículo alvejado, o que ocasionou um acidente, matando sua sobrinha de 6 anos.
Depressivo e culpado pela morte da criança, Aiden fica obcecado por segurança. Então coloca câmeras na casa da irmã e hackeia o novo sistema implantado na cidade, o ctOS, se tornando O Vigilante, não só de sua família, mas de toda Chicago (ficando até famoso em meio a população, que o apelidaram assim O Vigilante).
Pondo-se a enfrentar a máfia e várias gangues, Aiden agora está em busca de vingança pela morte da sobrinha. Com isso em mente, contrata um mercenário e um segundo hacker para ajudá-lo. Disposto a qualquer coisa para obter o nome do mandante e assim matá-lo, Aiden invade cada casa, cada celular, cada câmera ou semáforo, passando por cima de tudo e todos sem medir as consequências, fazendo inimigos por onde passa e tendo todos em seu encalço.
***
O jogo possui de tudo um pouco, drama, ação, perseguição, justiça. Aborda temas importantes como o quanto você expõe a sua vida na internet, o quanto está sujeito a ter seus dados vazados e principalmente, o quanto sua vida corre riscos quando se posta onde está em tempo real, dando margem para criminosos ou pessoas ruins.
Culpa e luto andam lado a lado, um corroendo o outro. Sofrer a morte de um familiar é importante e um divisor de águas. Algumas pessoas não conseguem seguir em frente ou, ainda, só podem viver tranquilamente quando outros pagam pelos erros cometidos (sendo o caso de Aiden), no entanto, ações têm consequências e tudo o que você decide para sua vida pode te perseguir no futuro. Tudo sempre é cobrado, não importando quanto tempo passe. Watch Dogs fala sobre isso e um pouco mais.
Por ser um game, obviamente não há o tempo necessário para a exploração profunda de cada tema, mas todos sabemos que um livro é melhor do que o filme e que, este jogo tornando-se um livro, teríamos muito mais intensidade e exploração da vida, ações e dor do personagem protagonista.
Aos que nunca jogaram, fica aqui a minha recomendação.
Curiosidades:
* Este texto refere-se ao enredo de Watch Dogs (1), porém existem mais dois jogos da franquia que utilizam do mesmo universo, em anos diferentes, com personagens e histórias diversas ao primeiro jogo. Sendo estes Watch Dogs 2 (2016) e Watch Dogs Legion (2020).
* Em 2014, em conjunto com o lançamento do game, um e-book intitulado "Watch Dogs: Dark Clouds", por John Shirley, foi publicando (não traduzido para o português), dando a continuação merecida a história do primeiro jogo narrado acima. Após este livro, em 2022 foi lançado o “Watch Dogs: Stars & Stripes”, por Sean Grigsby e Stewart Hotston (não traduzido para o português), que narram os eventos que ocorrem após o season pass (extensão da história do jogo) Watch Dogs Legion – Bloodline (2021), que se passa após os eventos terceiro game Watch Dogs Legion (2020), tendo novamente Aiden Pearce como protagonista.
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