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Memórias Literárias de Amora: manifesto sensível, forte e acolhedor


 


Por Maria José de Melo

 

Quando escrevi as primeiras páginas, em outubro de 2021, de um carta-manifesto de 18 páginas, que, nos anos posteriores, tornou-se o livro “Memórias Literárias de Amora: uma carta-manifesto”, já tinha consciência do quanto a dor, o sofrimento, o silêncio e o medo, os quais arranhavam a minha alma há anos, faziam parte de uma situação traumatizante. Submersa nas consequências de ter sido violentada aos 12 anos, encontrava-me esmagada por contradições diversas: de um lado, a perversidade do ser humano, que quebra ciclos e o desenvolvimento natural da vida humana; de outro, no movimento dialético da vida, também fui apresentada aos sentimentos mais nobres da condição humana: o amor, o acolhimento e a empatia. E foi na descoberta destes sentimentos que encontrei uma luz no fundo do poço no qual me encontrava naquela primavera silenciosa de 2021.

 

Por muito tempo, fiquei procurando um método, uma teoria como guia e uma prática que fizesse enlace ao meu jeito. Eu busquei uma teoria e uma prática que fosse capaz de me dar as condições intelectuais, materiais e objetivas para poder expressar o que eu sentia e me livrar da dor e angústia que sentia com tanta intensidade. O enfrentamento sempre será a fase mais difícil de se fazer, pois muitos podem virar as costas, mas o que importa é o nosso movimento de seguir sempre em frente.

 

Nesse sentido, Amora não é uma personagem de uma história ficcional. Ela é um movimento vivo de uma mulher que encarou as críticas sociais criando um pseudônimo para enfrentar a minha própria realidade concreta a fim de transformá-la. Apesar disso, foi apenas no processo de desenvolvimento do livro que conseguiu ganhar voz. À medida que ela (Amora) ganhava força com a escrita do texto, assumia no meu dia-a-dia que ela sou eu.

 


Ilustração da Amora: Juliana Pereira, 2025.

 

 

Conversar sobre algo mais íntimo (no caso, da dor sentida advinda de um crime sexual) estando em um espaço seguro de escuta e acolhimento, permite que não se fique e nem se sinta vulnerável. Mesmo porque o silêncio é um dos fatores que prolonga e provoca a expansão da dor e da vulnerabilidade. Por isso, precisamos falar para alguém com conhecimento sólido e que nos dê segurança, a fim de que o processo de fala e de recuperação possa ser o mais cuidadoso possível. Além disso, há outro fator que contribui negativamente nesse processo de “derrubada do muro do silêncio”: a negação por parte de familiares e amigos, pessoas do círculo social, do Estado etc., pois existe uma culpabilização da vítima e uma naturalização do ato criminoso por parte da sociedade.

 

Quando não falamos sobre um determinado assunto de forma naturalizada, por exemplo, uma violência sexual sofrida em qualquer fase da vida, isso pode significar que existe um bloqueio em nosso inconsciente quanto ao assunto. Ele pode ser gerado por insegurança, vergonha e/ou medo. A vítima sente culpa e medo pelo crime ocorrido, optando pelo absoluto silêncio. Isso a deixa refém do sentimento de culpabilização, em uma escuridão aparentemente eterna e em uma condição de sofrimento constante. Até porque, como já comentei, nem todas as pessoas estão prontas para acolher e entender a complexidade do que seja um crime sexual. A você que foi uma vítima, lembre-se sempre: NÃO FOI CULPA SUA!

 

Embora hoje eu considere a Psicoterapia o espaço mais adequado para buscar ajuda, na minha experiência, consegui abrir o assunto antes de chegar à terapia, mas foi extremamente difícil as primeiras falas. A primeira pessoa para a qual contei o que tinha acontecido comigo era de confiança – uma das minhas amigas com quem eu mantinha amizade há mais tempo. A vergonha e o sofrimento pareciam grandes demais nas primeiras tentativas de entender a escuridão dentro de mim. Na adolescência, eu não tinha uma pessoa para me espelhar ou que fosse realmente de confiança; na minha família não havia alguém com discernimento para trabalhar a questão comigo. Tive que ir abrindo o caminho sozinha, aos poucos, até aparecer alguém que, ao meu lado, mostrasse formas mais assertivas de enfrentar a questão. As primeiras tentativas de falas são do ano de 2014, mas até 2018, havia extrema dificuldade em entender o trauma do crime sexual. Estudar e militar foi a forma que encontrei para buscar me fortalecer e construir uma saída em um dia futuro. 

 

Nessa perspectiva, ressalto que o caminho mais seguro que uma pessoa vítima de violência pode encontrar para conseguir encarar os “muros do silêncio” que os cerca é buscar orientação profissional. Assim, acredito que a Psicoterapia seja a técnica mais segura e adequada, sendo possível encontrar um ambiente de confiança que possibilite aprender a lidar com cada questão envolvida.

 

Ademais, o desafio que encontrei na memória autobiográfica foi lidar com diversas situações ao mesmo tempo: ser a escritora, a personagem e a narradora. É difícil demais narrar e “pesquisar” um fato que dói tanto em nossa alma, além de complexo e sigiloso, e ainda escrever didática e fluidamente sobre os efeitos colaterais de um crime sexual que esmagou a minha vida por tanto tempo.

 

Nesse processo, também me deparei com uma escassez de conhecimento básico historicamente acumulado sobre o fenômeno da violência sexual e sua relação com os traumas advindos da violência sexual. Os textos produzidos pelas próprias vítimas são bastante escassos. Temos pouquíssimos livros de ficção e de não-ficção teorizando ou problematizando o assunto. Com o recorte que eu trago no meu livro, geralmente encontramos nas áreas acadêmicas, ou seja, de forma mais técnica, sem o relato pessoal. Já na literatura, existem casos bem secundários de relatos, sendo, portanto, pouco exploradas as raízes da origem da violência sexual e sua problematização, especialmente quando se trata de relacionar com a experiência traumática da própria vítima.

 

O “livro de Amora”, como carinhosamente o chamo, ganha notoriedade e particularidade dentro do gênero da memória literária e da discussão sobre a temática porque aborda a perspectiva de uma menina de origem camponesa da região do Semiárido brasileiro vítima do crime sexual. Parte, portanto, de um aprofundamento da condição de classe social, com o desenvolvimento da análise e com as explicações dos impactos da violência na vida da personagem. Há um relato estritamente particular, porém, cabe ressaltar que a narração não se limita apenas aos acontecimentos pessoais e íntimos. No livro, o fenômeno da violência sexual é apresentado de modo a se compreender que ele não se explica por si mesmo, desconectado das raízes materiais.

 

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